Entre
os escritores mais lidos da literatura brasileira, o romancista baiano
Jorge Amado (1912-2001) é um dos que mais usa o palavrão em sua vasta
obra literária.
A informação, obtida pelo folclorista
pernambucano Mário Souto Maior (1920-2001) durante sua pesquisa para
elaborar o “Dicionário do Palavrão e Termos Afins” (Editora Leitura),
consta no glossário.
Souto Maior percorreu várias regiões do
país para ajudar o brasileiro a entender a origem dos vocábulos
impróprios. Distribuiu 8.000 formulários para penetrar em todos os
cantos do país e consultou pessoas de diferentes níveis intelectuais,
das mais variadas idades e condições econômicas.
Cinco anos de pesquisa renderam mais de
3.000 verbetes, tidos como chulos. O pernambucano entrevistou várias
fontes e leu mais de 200 romances para finalizar o exemplar.
Falando em romances, Amado não é o único
intelectual que tem lugar garantido em cada letra do alfabeto. José Lins
do Rego (1901-1957), Gilberto Freyre (1900-1987) e Oswald de Andrade
(1890-1954), por exemplo, também figuram entre os “bocas-sujas”
letrados.
Publicado originalmente em 1974, com
prefácio assinado por Freyre, o dicionário sofreu censura dos militares.
O compêndio foi lançado na década de 1980, durante o governo de João
Figueiredo (1918-1999). A primeira edição esgotou rapidamente. O poeta
Carlos Drummond de Andrade (1902-1987) chegou a defender o glossário
publicamente na edição de 20 de março de 1980 do “Jornal do Brasil”.
À época, a pesquisa revelou que muitos
brasileiros acreditavam que o escritor baiano usava o palavrão no
momento certo, sem abusar. “Merda”, o palavrão mais utilizado pelos
franceses, também era o mais utilizado pela população do país.
A Livraria da Folha selecionou cinco
palavrões colhidos por Souto Maior na obra literária de Amado.
Reproduzimos conforme o “Dicionário do Palavrão e Termos Afins”.
*
- Dar a maricotinha: O mesmo que dar o
cu, ato de pederastia passiva (Bahia). “O demais que tinha praticado
Severina exatamente para impedir que ele lhe tirasse os tampos: onde o
reverendo Frei ouvira dizer que tomar no cu era o mesmo que dar a
maricotinha?” [AMADO, Jorge. Tocaia Grande. Rio de Janeiro, Record,
1984, p. 457].
- Fechar a cancela: Aposentar-se
sexualmente (Nordeste). “Já fechou a cancela, Boa Vida” [AMADO, Jorge.
Capitães de Areia, (3ª ed.). São Paulo, Martins, 1945, p. 93.]
- Levanta cacete: Mulher bonita, benfeita
de corpo, sexy (Nordeste). “Até onde a memória alcança, as mulheres da
família eram de encher o olho e de levantar cacete de morto” [AMADO,
Jorge. Tereza Batista Cansada de Guerra. São Paulo, Martins, 1972, p.
43].
- Papar: Comer, ter relações sexuais
(Nordeste, Sul). “Os aposentados e retirados dos negócios a viam e
desejavam: – E o senhor, comandante, papou?” [AMADO, Jorge. Os Velhos
Marinheiros (9ª ed.). São Paulo, Martins, 1961, p. 109].
- Zebedeu: Órgão sexual masculino
(Bahia). “As raparigas, à la vontè, umas seminuas, outras em pelo,
esfregavam trapos, banhavam-se, esquecidas em vadio converse.
Atarantado, o adolescente não soube o que fazer nem como impedir o
zebedeu de crescer sozinho na braguilha” [AMADO, Jorge. Tocaia Grande.
Rio de Janeiro, Record, 1981, p. 241].
Sinopse
Não se trata de um livro de palavrões,
mas de uma das mais completas pesquisas dentro da sociolinguística e a
mais completa acerca do uso de palavrões e termos afins da Língua
Portuguesa. Este aspecto do dicionário é bastante ressaltado na
apresentação do livro produzida pelo jurista Eliézer Rosa. Que diz
tratar-se de “um levantamento da gíria, da linguagem especial, ou,
talvez, de uma língua especial de minorias; de palavras, expressões e
modismos que fazem parte da linguagem do povo”.
O volume apresenta os palavrões
característicos de todas as regiões do país. Ou seja, ele nacionaliza a
cultura popular, levando o palavrão típico do Amazonas ao conhecimento
da população do Rio Grande do Sul. E quem nunca ouviu dizer que o uso do
palavrão é necessário para evitar o enfarte do miocárdio e descarregar o
homem de tensões emocionais?
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